13.2.11

Egipto: o que aqui já foi dito, por Alberto Gonçalves

Alberto Gonçalves diz o que já aqui foi dito no blogue por Barry Rubin e Daniel Greenfield, mas em bom português:

Amplify’d from www.dn.pt
ALBERTO GONÇALVES
dias contados

O que querem os egípcios

por ALBERTO GONÇALVESHoje31 comentários

Desde o início da revolta no Cairo, somos diariamente abalroados por correspondentes televisivos a informar-nos de que o povo egípcio quer liberdade, democracia e beatitude celestial. Tamanha pureza comove, e é notável como uma simples visita à multidão que berra na Praça Tahir, ou lá o que é, permite aos argutos jornalistas detectar imediatamente os anseios de uma população de 81 milhões.

Se calhar, não permite. Se calhar, os jornalistas confundem o seu ofício com a repetição de clichés, na convicção um bocadinho infantil de que qualquer protesto público contra uma ditadura acarinha valores opostos aos ditatoriais. Correndo o risco de passar por retrógrado, ainda julgo que a melhor maneira de averiguar os sentimentos de um povo é inquiri-lo com rigor estatístico e não pedir a meia dúzia de voluntários que desabafem perante as câmaras.

Nem de propósito, em Abril e Maio de 2010 o Pew Research Center sondou os egípcios sobre o que de facto querem. Espantosamente, os resultados não são bem os obtidos pelo jornalismo que, dada a abundância de espaço, enche o crânio com "causas" e crendices, passe a redundância.

Em primeiro lugar, 59% dos egípcios exigem democracia (22% são-lhe hostis e 16% mostram-se indiferentes), a segunda percentagem mais baixa dos sete países muçulmanos estudados na referida sondagem. Ao mesmo tempo, 85% defendem um papel determinante do islão na política (apenas 48% achavam que o papel era assegurado na regência de Mubarak). 80% acham os atentados suicidas nunca ou raramente justificáveis (20% acham-nos frequen- temente justificáveis). No que toca aos costumes e à justiça, 54% pedem a segregação de homens e mulheres nos locais de trabalho, 82% pedem o apedrejamento das adúlteras, 84% pedem a condenação à morte dos apóstatas do islão e 77% pedem a amputação das mãos dos larápios (Mubarak não concedia tais prazeres).

Visto assim, o tipo de regime livre e democrático a que os egípcios aspiram não difere muito desse bastião da liberdade e da democracia chamado Irão, cujas luminárias imitaram o Hamas, a Irmandade Muçulmana e organizações fascistas afins e já surgiram a apoiar a luta dos insurgentes contra os "opressores": os EUA, Israel e o Ocidente em geral. O curioso é que a relativa proximidade ao Ocidente continha a opressão local dentro de limites brandos para os padrões da região. Afinal, o que a maioria ruidosa ou silenciosa de egípcios quer é a possibilidade de viver sob a barbárie da sharia. Salvo excepções inconsequentes, o combate à tirania de Mubarak faz-se em nome de uma tirania imensamente pior.

Os egípcios estão no seu direito? Sem dúvida. O aborrecido é semelhante direito colidir regularmente com o sossego alheio. Após a queda de Mubarak, as odes dos jornalistas à alegria do povo e as invectivas aos "cínicos" que não a partilham resultam de óptimas intenções, mas de péssima memória. A História recente ensina que a felicidade de certos transtornados religiosos tem um preço: a nossa.

Read more at www.dn.pt
 

4 comentários:

AMDG disse...

Lamento que me hayas dejado de leer.

¿Te gustaría comentar sobre esto?

http://layijadeneurabia.com/2011/02/04/los-catolicos-no-podemos-ser-antisemitas-pero-tenemos-que-ser-anti-judios/

Luís Cardoso disse...

Colo resposta que deixei na caixa de comentários do blogue do AMDG. Divido em mais de um comentário porque o blogger tem um limite reduzido para a sua dimensão:

«Prezado AMDG,
é curioso que me proponhas comentar esta entrada do teu blogue, referindo de passagem o facto de eu ter deixado de vos ler. É que foi justamente devido ao anti-semitismo que assola o vosso blogue que deixei de o fazer e que o retirei da lista de blogues do meu.
Comento, então, o título desta entrada (apenas o título, porque não li o conteúdo) e explico, de certo modo, a decisão de deixar de seguir a vossa actividade – o que lamento, porque encontrei neste blogue muito material de grande qualidade a respeito do islão e do al-Andaluz.
Como católico, não posso deixar de repudiar o anti-semitismo.
Não sou exegeta, não sou presbítero, sou um simples leigo. A única coisa que me ocorre fazer em defesa da minha posição é citar o Concílio Vaticano II, na Declaração Nostra Aetate:

(continua)

Luís Cardoso disse...

(continuação)

«A religião judaica

4. Sondando o mistério da Igreja, este sagrado Concílio recorda o vínculo com que o povo do Novo Testamento está espiritualmente ligado à descendência de Abraão.

Com efeito, a Igreja de Cristo reconhece que os primórdios da sua fé e eleição já se encontram, segundo o mistério divino da salvação, nos patriarcas, em Moisés e nos profetas. Professa que todos os cristãos, filhos de Abraão segundo a fé (6), estão incluídos na vocação deste patriarca e que a salvação da Igreja foi misticamente prefigurada no êxodo do povo escolhido da terra da escravidão. A Igreja não pode, por isso, esquecer que foi por meio desse povo, com o qual Deus se dignou, na sua inefável misericórdia, estabelecer a antiga Aliança, que ela recebeu a revelação do Antigo Testamento e se alimenta da raiz da oliveira mansa, na qual foram enxertados os ramos da oliveira brava, os gentios (7). Com efeito, a Igreja acredita que Cristo, nossa paz, reconciliou pela cruz os judeus e os gentios, de ambos fazendo um só, em Si mesmo (8).

Também tem sempre diante dos olhos as palavras do Apóstolo Paulo a respeito dos seus compatriotas: «deles é a adopção filial e a glória, a aliança e a legislação, o culto e as promessas; deles os patriarcas, e deles nasceu, segundo a carne, Cristo» (Rom. 9, 4-5), filho da Virgem Maria. Recorda ainda a Igreja que os Apóstolos, fundamentos e colunas da Igreja, nasceram do povo judaico, bem como muitos daqueles primeiros discípulos, que anunciaram ao mundo o Evangelho de Cristo.

Segundo o testemunho da Sagrada Escritura, Jerusalém não conheceu o tempo em que foi visitada (9); e os judeus, em grande parte, não receberam o Evangelho; antes, não poucos se opuseram à sua difusão (10). No entanto, segundo o Apóstolo, os judeus continuam ainda, por causa dos patriarcas, a ser muito amados de Deus, cujos dons e vocação não conhecem arrependimento (11). Com os profetas e o mesmo Apóstolo, a Igreja espera por aquele dia. só de Deus conhecido, em que todos os povos invocarão a Deus com uma só voz e «o servirão debaixo dum mesmo jugo» (Sof. 3,9) (12).

Sendo assim tão grande o património espiritual comum aos cristãos e aos judeus, este sagrado Concílio quer fomentar e recomendar entre eles o mútuo conhecimento e estima, os quais se alcançarão sobretudo por meio dos estudos bíblicos e teológicos e com os diálogos fraternos.

Ainda que as autoridades dos judeus e os seus sequazes urgiram a condenação de Cristo à morte (13) não se pode, todavia, imputar indistintamente a todos os judeus que então viviam, nem aos judeus do nosso tempo, o que na Sua paixão se perpetrou. E embora a Igreja seja o novo Povo de Deus, nem por isso os judeus devem ser apresentados como reprovados por Deus e malditos, como se tal coisa se concluísse da Sagrada Escritura. Procurem todos, por isso, evitar que, tanto na catequese como na pregação da palavra de Deus, se ensine seja o que for que não esteja conforme com a verdade evangélica e com o espírito de Cristo.

Além disso, a Igreja, que reprova quaisquer perseguições contra quaisquer homens, lembrada do seu comum património com os judeus, e levada não por razões políticas mas pela religiosa. caridade evangélica. deplora todos os ódios, perseguições e manifestações de anti-semitismo, seja qual for o tempo em que isso sucedeu e seja quem for a pessoa que isso promoveu contra os judeus.

De resto, como a Igreja sempre ensinou e ensina, Cristo sofreu, voluntariamente e com imenso amor, a Sua paixão e morte, pelos pecados de todos os homens, para que todos alcancem a salvação. O dever da Igreja, ao pregar, é portanto, anunciar a cruz de Cristo como sinal do amor universal de Deus e como fonte de toda a graça.»


(continua)

Luís Cardoso disse...

(continuação)

Quanto à distinção entre anti-semitismo e anti-judaísmo: não vejo que exista (a propósito, parece-me que até o anti-sionismo é outro nome para este mesmo fenómeno).
O que é que designa classicamente a expressão «anti-semitismo»? Aversão aos povos semitas? Não! Aversão aos judeus.
A distinção entre judeus por etnia e judeus por religião é recente e artificial; e tem origem nos meios extremistas de direita e de esquerda, aliados dos muçulmanos na sua luta eterna contra os judeus.

Por isso, meu caro, lamento continuar a privar-me da leitura dos vossos textos e do benefício da vossa companhia.

Cordialmente,